Sunday, October 16, 2005

Horario de verao, acertem seus relogios

*Quando eu vim estudar aqui nos EUA, comecei a ter que lidar com as coisas de sempre e com coisas novas, e achava que, estando "sozinha", guiar minhas acoes pelo que minha cabeca julga certo, justo e sincero seria a unica opcao, portanto, simples de se fazer.
Mas nao e assim tao simples...
Hoje eu convivo com aqueles pra quem eu sou a "menina brasileira que veio estudar na UT em 2005", gente que pensa que essas 9 palavrinhas resumem tudo o que eu era antes de pisar nesse pais, e por isso me dao direito a um "zero", uma partida, um ponto que desconsidera qualquer coisa que existesse antes...
So que antes faz diferenca.
Hoje eu convivo com aqueles que dividiram comigo 19 anos, mas que de certa forma, sem eu conseguir me dar conta do que isso significa, perderam os ultimos tempos da minha vidinha... Eh certo que nao perderam o "macro", nao perderam as descricoes dos lugares, das aulas, das pessoas, do estilo de vida, nao pereram o "resumo da experiencia"... mas tambem eh certo que nao estao mais perto do "micro nosso de cada dia"... Por sete meses eles nao aguentaram o mau humor de manha, nao cobraram beijo na hora de chegar em casa, nao bateram na porta aquele dia que tinha prova e o despertador nao tocou, nao deram carona o dia que a lei da gravidade agiu contra na porta do predio e ralou os joelhos, fez perder o onibus...
So que olha so. Agora tambem faz diferenca.
E eu nao sei se eu quero que faca.
Eu nao sei se eu quero que as coisas de agora sejam pra sempre. Nao quero seguir os conselhos que eu ouvi tantas as vezes aqui, de me desapegar, de pensar menos no que esta longe, de aproveitar o lugar e o minuto... Porque eu morro de deixar de acreditar que eu ja tenho uma historia, um caminho que agrada a quem eu amo, que eh seguro, que eh bom...
Mas, ao mesmo tempo, eu nao sei se quero que as coisas de ontem sejam as unicas. Nao quero pensar que, daqui pra frente, tudo que vier a se agregar eh "duvidoso", eh "mal", eh caracteristica que so passou pelo julgamento da minha cabecinha, muitas vezes sugerida por gente que nem eh muito "boa" nao...essa coisa de "se eh pra voltar pior eh melhor ficar em casa"... eh preciso que qualquer experiencia nova pra mim seja uma confirmacao da formula? A ideia de que "por-mais-que-eu-improvise-eu-ja-sei-o-final"... Que eu tenho coisas em mim que vao ser o que sao pra sempre...ela me faz sentir velha, gasta... triste...

**Como renovar, se a novidade eh cega, atropela as coisas que eram antes, agride, cansa, desgasta tanto? Como reconstruir, se o passado grita alto, e vai rachando agudo os novos pilares de mim? Como andar confiante entre o que eu era e o que eu sou, se tudo o que eu vejo eh que quem caminha sozinho carrega na mala as caras desconfiadas de qualquer um dos tempos, do passado, do presente... e as vezes ate pisoteia as pessoas que ama sem querer?

***Eh estranho estar longe. Eh ainda mais estranho estar longe e saber que se volta... porque ha que se reportar pra diversas instancias, e eu nao sei se so os meus valores dao conta delas todas... sem ferir ninguem e sem me ferir...
E de tudo isso, so sei que, com o horario de verao, estou uma hora mais longe do tempo do Brasil. E que, a cada badalada do seu relogio adiantado, eu estou uma hora mais perto de casa.
Como se o tempo e a geografia zombassem do meu pavor.