Tuesday, February 22, 2005

Band-aid

Que os justos avancem
Ainda que sejam imperfeitos
E estejam feridos.

Mario Benedetti

*Cresci numa familia em que nunca me ensinaram a usar meus trunfos para obter vantagens com as coisas. E um ensinamento que faz falta, principalmente nos jogos de cartas e no amor.

Ao contrario disso, preferiram me ensinar que existe um mundo pendendo das mais inimaginaveis carencias, e que estar a servico desse mundo e a nossa propria razao de existir. Mas esse ensinamento tambem me vale de alguma forma: atrai pra minha vida alguns dos amigos mais leais que se pode ter; e me da a sensacao constante de dever nao cumprido, que por mais que seja incomoda, e muito companheira.

Acredito que 90% das pessoas que amo sao, cada uma a sua moda, perseguidoras da justica. Algumas delas nem se dao conta disso. Dessa vontade absurda de fazer a terra tremer no grito quando algo muito errado acontece a sua volta, mesmo que o berro gaste folego e nao mude nem um minuto das suas proprias vidas.

Postei isso hoje pra uma dessas pessoas que me ensinaram a nao querer estar no topo, mas sim querer ser parte de um mundo mais justo. E que esta triste por ter sentido uma grande injustica acontecer por perto, sem poder fazer nada pra mudar. Isso doi a beca. Doi. Mas talvez alivie saber que nos doemos juntos...

Table of Contents

O meu olhar e nitido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para tras...

E o que vejo a cada momento
E aquilo que nunca antes eu tinha visto
E eu sei dar por isso muito bem...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma crianca se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo...

Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo.
Mas não penso nele
Porque pensar e nao compreender...
O Mundo não se fez para pensarmos nele (Pensar e estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...

Eu nao tenho filosofia; tenho sentidos...
Se falo na Natureza nao e porque saiba o que ela e,
Mas porque a amo, e amo-a por isso
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que e amar...

Amar e a eterna inocencia,
E a unica inocencia nao pensar...

Alberto Caeiro, em "O Guardador de Rebanhos", 8-3-1914

*E dificil render-se. Render-se e quase como mudar os moveis do quarto de lugar: quando e noite, os caminhos se confundem, e voce tropeca naquilo que jurava nao estar ali. Talvez sejamos mesmo um "comodo de ideias", ideias moveis-imoveis sobre as quais descansamos, amamos e tropecamos...
Esse blog e resultado da insistenca de alguns amigos e familiares, que querem e tem todo o direito de compartilhar comigo uma novidade: sao 54 dias longe de casa (leia-se casa, comida, roupa lavada, familia, novela e festa de aniversario), 47 dias alem da minha antiga marca... Aqui esta, entao.

**O poema. Era pra ser um presente de despedida do meu pai pra mim. Por armadilha do inconsciente, ficou em seu bolso. Mas tendo chegado algumas semanas depois, mais do que um jeito de dizer adeus, tranformou-se num presente pra vida. O que aconteceu no meu tempo entre o embarque e o poema faz ainda mais especial o desafio de sentir-se novo pra um mundo que e novo. Prova-lo, nao entende-lo... render-se... por isso e o primeiro post.

***O poema 2. Bem vindo ao mundo, Caique. Que a novidade do seu olhar nos faca mais felizes, mais ternos, mais crentes perante a vida. A vontade de te conhecer me faz querer estar em casa. Nos veremos logo, ok?