Tuesday, May 31, 2005

Só muda o endereço

*Estou em casa, de férias, com todos os acentos, cedilhas e crases a que tenho direito. Mesmo assim, resolvi dar um tapa no blog. Só pra contar que, na manhã do dia 13 de maio, era tamanho o nevoeiro sobre a pista que eu nem vi quando o avião pousou no aeroporto de Guarulhos. Longe da janela, só me restou sentir o trem de pouso tocar o Brasil e estremecer... de saudade, de alegria, de medo... tanta coisa...

**Estou em www.anjosdeprata.com.br , como estreante da quinzena, cujo tema é meia-luz (embora meu texto tenha sido enviado pro tema anterior, confissão). Chamaram-me de autora por lá, e assumo, isso me fez certas cócegas no ego, por mais que o texto publicado me pareça precário demais pra garantir tal pecha. Mas como estou em um exercício pessoal de me permitir a tentativa, o erro e o aprendizado, ainda não mandei um e-mail desesperado pedido pra que apaguem aquele absurdo de lá.

***O texto do Anjos é trabalho antigo, portanto, sem os acentos. Como esse blog continuará se chamando em sua nova fase, afinal, da lista de coisas que essa linha fina aí em cima conta que eu não tenho, só os sinais gráficos é que teimaram de aparecer no Brasil...

Sunday, May 08, 2005

P(revisao) do Tempo

*Hoje acordei no meio da madrugada, e vi o dia nascer da minha janela. Ele veio manso do leste, e entao seu brilho, perante a densidade das nuvens por que tinha que passar, desistiu de reluzir branco e quente sobre Austin. Era como se cada raio de sol fosse um simples feixe de luz cinzenta, assustada, cumprindo o pedante papel de anunciar uma manha de tempestade.
Eu ainda estava acordada quando a chuva bateu violenta e esfriou minha janela, meu quarto e minhas cobertas.

**Nisso, Deus (esse e o nome que eu dou) falou comigo por uma metafora, e assim eu entendi o que ele explicou.
Hoje o meu tempo, o cronologico, e uma tempestade. E eu estremeco a cada giro do relogio como estremeci aos trovoes dessa manha.
O tempo sob o qual por tantas vezes me senti estatica, como um pilar de concreto sob a chuva, gastou-me a cada gota sem que eu pensasse em reagir. Fez girar um universo a minha volta; e a mim, restou-me observar sua forca impassivel, a levar os fatos pra longe do alcance dos meus dedos e da minha compreensao.

***No mesmo pedaco de ceu pra que olhava de manha, vejo agora o sol brilhante se pondo num imenso de azul, raramente nublado de branco. O som da brisa leve, daqui do 22o andar, compete com o barulho sumido dos carros e das pessoas na rua. Como se raios e trovoes jamais tivessem nos visitado um dia, menos ainda na manha de hoje.
A certeza de que nao sonhei com a chuva esta somente nas folhas espalhadas pelo chao, e na garoa fina que umedeceu os meus cabelos e os meus olhos enquanto caminhava por ai.

Tuesday, May 03, 2005

As tres daquela tarde

*Blem Blem Blem
Ele ouviu. Eram tres, o sol saia do pino, ele sabia porque podia ver e ouvir la da praca.
Quase toda vez fazia calor, e quando fazia muito, ele podia ver as sombras das arvores fazendo bichos no chao. Assim era o melhor jeito de enxergar: tinha que subir na jaboticabeira, as vezes era dificil subir, mas ja dos galhos do meio voce olhava o banco de areia e os bichos apareciam. Bichos que nao se gostavam ficavam ali, um do ladinho do outro, bem comportados, so sombreando. Um lobo pequenininho do lado de uma ovelhona. Quando aparecia um gato, dava pra fazer um cachorro com a mao mesmo.
Melhor se era outubro, porque as jaboticabas matavam a fome das cinco, e dava pra ficar na praca ate mais que seis. Em mes que a arvore estava vazia, so se aguentava ate umas 4 e pouquinho, que as cinco a vo podia fazer bolinho de chuva, e nao tem brincadeira no mundo que seja melhor que isso.
Mas naquele dia ainda eram tres, e o chato era que o primo dele, aquele meio bobo que ve muita teve, queria fingir que as sombras eram bichos feios do espaco. Ele la achava que tinha bicho no espaco, coisa viva vive na terra, ue, que no espaco so tem estrela quente e planeta gelado!
Mas pior que ter o primo era ter que ir na escola. Era estranho, mas tinha alguma coisa naquele sino da escola. Na praca, o sino da igreja cantava as horas tao bonito, e as horas passavam tao rapido, que parecia uma melodia sem fim, uma hora cantada depois da outra. Na escola o sino so berrava, berrava no ouvido dos alunos quanto tempo faltava pra saida.
Aquele dia a mae disse que ele nao precisava de escola, e ele nem tinha pedido. Falou pra ele ir pra praca com o primo.
Ela e a tia estavam na cozinha com os olhos molhados, pareciam que nao queriam crianca perto, entao ele foi. Talvez fosse por causa da visita, ele viu que chegou o homem de branco no quarto da vo, era tao de manha que o sol nem tinha saido ainda. O homem ele conhecia, ele tinha um aparelho de ouvir coracao e dava bala. Foi ele que falou pra mae ligar pra tia, a mae sempre obedece o que ele diz, mesmo que ele mande comprar xarope.
Ele ainda dormia quando a tia chegou, entao de manha achou o primo sozinho na sala com a teve ligada e nao entendeu coisa nenhuma. Estava na cozinha comendo bolacha quando a mae veio e deu um abraco, um abraco muito molhado. Parecia ate domingo, a casa foi ficando cheia de parente quando ele e o primo foram brincar.
Foi quando soaram as tres horas que ele pensou em tudo isso, e pensou de ir ver se a mae e a tia ja podiam contar porque elas tinham que ligar pra tanta gente e fazer tanto cafe naquele dia. Se as duas nao quisessem ver crianca, ele podia ficar com a vo. Podia ver os dedos dela enrolarem o trico e rir dos barulhos que ela fazia dormindo. Ela andava dormindo mais e mais, e quanto mais ela dormia, menos mimo ela fazia, e o menino ficava triste sem saber porque. Foi quando soaram as tres horas que ele pensou em ver a vo. "Sera que ela vai fazer bolinho hoje?"
Entao puxou o primo pra casa, antes que pudesse lembrar da praca, do sino, do tempo ou das coisas que se perdem quando os minutos se vao. Porque dessas coisas ele ainda nem sabia.